sábado, 31 de outubro de 2015

Educação sexual coletiva

[Essa é uma perspectiva centrada em relacionamentos heterossexuais porque achei que se encaixava mais com o padrão sexual heteronormativo]
"Então... isso foi sexo."
 Um dia desses eu e uma amiga passamos a noite ouvindo músicas que eram famosas durante a nossa infância. Passamos por Rouge, KLB, Rebelde e Bruno e Marrone. Mas o que realmente ficou na minha cabeça foi uma música de Caju e Castanha. Lembro de ter visto muitas vezes a dupla se apresentar nesses programas de fim de semana, cantando sobre a semelhança da “mulher do amigo” com instrumentos musicais.
 A letra era engraçada e essa era a única coisa da qual eu me lembrava, até a ouvir novamente. E aí resolvi lançar o raio problematizador e falar sobre tudo que está errado não só com essa música, como com toda a educação sexual coletiva que recebemos da mídia.
 A primeira coisa que me incomoda é o conceito de mulher de alguém. Acho bizarro e quase assustador usar mulher como se a palavra denotasse um sentido de relacionamento e de posse. Não se fala do homem de alguém, nem de esposa e homem, ou de ex-homem quando há separação. Mas é sempre marido e mulher, ex-mulher e a mulher de fulano. É o tipo de coisa que acontece tanto que dificilmente paramos para analisar e perceber que é, no mínimo, estranho.
 E aí tem toda a objetificação da mulher durante a letra inteira. Isso já dá pra perceber logo de cara porque, ao falar sobre a sexualidade feminina, o homem é representado como protagonista e a mulher como “instrumento musical”, ou seja, um objeto inanimado que será usado de acordo com os desejos de quem o manuseia. Nem quero entrar no mérito de analisar cada uma das coisas que o cara propõe fazer com a mulher, mas só partindo dessa comparação fica fácil notar que tá tudo errado.
 Mas, isso não é tudo. Se fosse só uma música de sei lá quantos anos trás, tava tudo ótimo. O problema é que há várias letras que escutamos o dia todo que tem esse mesmo princípio: apresentar a mulher como objeto de desejo e o objetivo masculino de ter uma listinha com nomes femininos que servem como conquistas.
 O que assusta ainda mais é que sabemos o quanto a música entra na nossa cabeça. Uma coisa que Felipe Pena usa para provar a influência musical é comparar a dificuldade de resumir cinco livros precisamente - com o começo, meio e fim -, com a de cantar cinco músicas inteiras ou de sintetizar o que elas dizem. O arranjo musical torna muito mais fácil absorver as informações. Sendo assim, o que escutamos ao longo de nossas vidas tem influência na forma que pensamos.
 É claro que não é, necessariamente, um processo de alienação, porque podemos filtrar criticamente o que nos é útil e o que é dispensável, mas ainda assim essas composições funcionam como um reflexo cultural do que é pensado. Ninguém comporia uma música falando sobre embebedar mulheres afim de retribuições sexuais (ou seja: estupro) se não houvesse a cultura de fazer esse tipo de coisa.
 Além das músicas, ainda temos filmes, programas, revistas e regras implícitas que ditam essa postura sexual. Há produtos cujo único objetivo é vender o corpo feminino como uma mercadoria para satisfazer desejos sexuais. Há conceitos de que mulher é “para casar” e de que mulher é “para se divertir” sendo passados em rede nacional em tentativas falhas de fazer humor.
 É uma mão dupla. Ao mesmo tempo que se ensina aos homens que eles precisam ser “experientes” e que é da “natureza deles” serem seres sexuais compulsivos, justificando o adultério e enfatizando a masturbação, as mulheres aprendem que não podem ser puras demais ou serão chamadas de frígidas, mas também não podem expressar muito desejo sexual porque isso demonstra falta de caráter. Toda a criação do papel sexual feminino é voltada para agradar a um parceiro egocêntrico que está centrado no seu próprio prazer.
 Por isso tantas mulheres sexualmente frustradas, tanta mistificação em torno do orgasmo feminino e tantas travas inúteis que são colocadas. A mulher aprende que a primeira relação sexual vai doer, aprende que eventualmente vai ter que fingir o orgasmo, aprende que certas coisas só as mulheres que “não se dão o valor” fazem.
 É quase uma cultura de medo que se cria, o sexo visto como uma obrigação. E não é para ser assim. Não é para ter alguém cujas necessidades são colocadas em primeiro lugar ou a existência de um patamar elevado, é para ser algo mútuo, algo compartilhado.
 A sexualidade feminina não é uma lenda, não é uma invenção. É uma preocupação e é, especialmente, algo que precisa ser discutido e valorizado.

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Arquivo S: Cake, Uma Razão para Viver

 Sei que Jennifer Anniston é praticamente um amor universal, então imagino que todo mundo entenda a sensação de ir assistir a algo sem sequer saber direito sobre o que se trata só pela atuação dela. Foi exatamente assim que aconteceu comigo em relação a Cake, um filme do ano passado, no qual ela interpreta a protagonista.
 Desde o começo, a proposta foi apresentar um lado diferente da atuação dela, fugindo dos papeis mais comerciais que ela tinha interpretado nos últimos anos. E que diferença: a personagem mal-humorada, desbocada e, por vezes, rude combinou com Jennifer de uma forma extraordinária.

ENREDO
 Cake, que recebeu o maravilhoso subtítulo de Uma Razão para Viver (que poderia ser muito bem o nome de uma novela mexicana), fala sobre Claire, uma mulher que sofre com dores crônicas e depressão. Depois que Nina (Anna Kendrick), uma das mulheres do grupo de apoio que frequenta, comete suicídio, ela fica obcecada em saber mais detalhes sobre o acontecimento.
 A obsessão é tanta que inclui visões e conversas com a personagem de Anna Kendrick e visitas à sua família. De alguma forma, o foco de Claire na vida de outra pessoa a ajuda a ver seus problemas com mais facilidade e a impulsiona a fazer pequenas mudanças.

ELENCO
 É impossível não falar de como o papel foi absorvido e interpretado perfeitamente por Anniston. A personagem não era fácil e sua condição exigia uma preparação física e emocional que a atriz conseguiu dominar de modo fantástico. Por se tratar de alguém que sente muitas dores, era preciso a capacidade de demonstrar de forma não caricaturesca a situação, com uma movimentação comedida e expressões faciais que tinham que combinar com o estado do corpo. E funcionou super bem.
 Outra que é maravilhosa e que, inclusive, tem uma indicação ao Oscar no currículo é a Adriana Barraza, que interpreta a empregada de Claire. Cheia de cuidados que vão bem além do que se cobraria, a personagem é linda e tem uma sutileza misturada com o humor involuntário, sendo extremamente cativante.
 Anna Kendrick teve o desafio de interpretar as visões de Nina tidas por Claire e isso também exigia muito. Apesar do aspecto ter sido trabalhado menos do que deveria e do que seria lógico para construir o roteiro, houve um desenvolvimento que combinava com a forma que a própria Claire se via e o papel combinou muito com Kendrick, que também é um amorzinho em forma de pessoa.

FOTOGRAFIA
 A direção de arte desse filme é genial. As cores se tornaram, em muitas cenas, praticamente personagens da obra. A sobriedade em momentos de tensão e a quebra dos tons pastéis para representar a mudança foram transmitidas de forma fantástica.
 Outra coisa que me chamou atenção foi o uso da regra dos 2/3, que representa esse enquadramento em que o elemento fica no cantinho da cena. Os planos foram, no geral, bem abertos, acredito que para enfatizar essa questão das paletas de cores como elementos da narrativa.
 Apesar disso, também foram usados planos com foco nos rostos dos personagens, para ajudar a transmitir as emoções que eram, também, traços importantíssimos da trama.

OPINIÃO FINAL
 Sei que já deixei isso bem claro, mas pra mim o grande destaque desse filme foi a atuação da Jennifer Anniston. Tava linda, maravilhosa, sensível e mostrou que sabe sim atuar em coisas diferentes das comédias românticas que costuma fazer.
 Como mencionei antes, esse aspecto da obsessão da Claire em relação a Nina poderia ter sido mais trabalhado porque dá a impressão de que nem foi tão importante assim no fim das contas. Apesar disso, gostei muito do tom humorístico no meio de toda a tensão porque funcionou super bem.
 Senti falta de um pouquinho mais de desenvolvimento dos outros personagens, mas como era um roteiro muito emocional e focado na protagonista, acredito que não seja exatamente uma falha, só uma decisão narrativa.
 No geral, é um filme super interessante e que, com certeza, vai encher de orgulho o coração de quem já ama a Jennifer. Quatro estrelas.

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

As séries de Shonda Rhimes + 5 razões para amá-la

 Quem me conhece sabe que eu e a Shonda mantemos uma relação de amor e ódio. Apesar de eu ser apaixonada por absolutamente qualquer coisa que tenha o nome dela envolvido, ela é a rainha de me deixar na bad: Seja por separar um casal que eu ame muito, por matar um personagem ou por escrever umas cenas que me irritam. Mas, no geral, não posso parar de recomendar as séries da Shondaland pra todo mundo.
 Cheios de personagens fortes, tramas super envolventes e um engajamento social maravilhoso, esses seriados são alguns dos meus favoritos do universo e tem um lugar super especial no meu coração. Por isso, me sinto na obrigação de dividir esse mundo agridoce com vocês.

Grey's Anatomy (2005 - )
 É muito provável que você já tenha assistido pelo menos um episódio perdido de Grey's - como nós chamamos carinhosamente - porque a série já está no ar há mais de 10 anos. Por isso, ela foi meu primeiro contato com Shonda. Desde sempre, gostei de assistir vez ou outra quando estava passando na TV, mas só há pouco mais de um ano resolvi fazer a boa e velha maratona na Netflix e me apaixonar de vez.
 É difícil sintetizar tudo porque durante as 12 temporadas que nós já temos (e a promessa de que muitas ainda estão por vir!) muita coisa mudou, mas tudo partiu da história de Meredith Grey, uma interna de medicina que estava prestes a começar a trabalhar em um hospital.
 Mas, não é só de cirurgias, diagnósticos e raios-x que se vive Grey's Anatomy. Tem muito drama envolvendo os próprios médicos e, claro, os pacientes. Tem quem se apaixone, quem case, quem engravide, quem quase morra (algumas vezes), quem traia. Tem um pouquinho de tudo. 
 Se as paredes daquele hospital pudessem falar, contariam segredos sórdidos e uns acontecimentos que ninguém mais acreditaria.

Scandal (2012 - )
 Quando terminei de maratonar Grey's, resolvi me enfiar um pouquinho mais nesse universo de Shondaland e aproveitar que já tinha Scandal no Netflix. E só a partir daí é que notei que realmente qualquer coisa que a Shonda fizesse ganharia meu amor. Mais uma vez ela me conquistou inteiramente.
 A série fala sobre Olivia Pope, uma gestora de crises (?) que é ex-funcionária da Casa Branca e que, casualmente, tem um caso com ninguém mais, ninguém menos que o presidente dos Estados Unidos. Pra mim essa é a série mais difícil de explicar no mundo porque não dá pra resumir tudo que abrange, mas juro de dedinho que vale muito a pena assistir.
 Olivia já lidou com uns crimes complicadíssimos, ajudou em eleições - inclusive na do próprio presidente de quem é amante - e é, simplesmente, a maior resolvedora do problemas do mundo. Não há desafio grande demais para ela, tudo pode ser resolvido se passar pelas mãos dos Gladiadores (como ela chama os membros de sua equipe).

How to Get Away with Murder (2014 - )
 Annalise Keating foi a última das mulheres de Shondaland que conheci, mas nem por isso é menos maravilhosa que as outras. Se tem uma coisa que Shonda Rhimes sabe fazer brilhantemente é criar protagonistas fortes e maravilhosas. HTGAWM - como é chamada pra encurtar esse título gigante - só entrou no Netflix há alguns meses porque ainda está na segunda temporada. Apesar disso, é muito intrigante e maratoná-la é quase que obrigatório.
 A protagonista é uma professora de direito e advogada que dá estágios para cinco dos seus melhores alunos, os treinando para entender como agir no tribunal com maestria. Ela é incrível no que faz e é capaz de ganhar qualquer causa.
 Só isso já era suficiente para atrair a minha atenção, mas o seriado mistura o ofício de Keating com mistério de forma extremamente cativante, tendo um caso maior que se estende por toda a temporada e um outro crime que vai sendo construído por flashforwards que cumprem a função de aguçar a curiosidade do público.
 Essa é a única das séries em que Shonda não é roteirista, só produtora. Mas, por ser a que tem menos episódios, é um bom pontapé para conhecer o trabalho dela. Juro que os traços que diferenciam o trabalho de Rhimes ainda estão presentes na trama. 

 Se esses não foram motivos suficientes para convencer que a mulher é maravilhosa e faz séries maravilhosas, aqui vão as minhas cinco coisas favoritas em relação ao trabalho dela. Dê uma chance pra Shondinha quebrar seu coração, juro que vale a pena.

terça-feira, 20 de outubro de 2015

A técnica Pomoro: Como aumentar sua produtividade

[Um beijo pra quem viu esse post antes de todo mundo, quando postei sem querer! Hahaha.]
 Já estamos na semana do Enem e acreditem em mim quando eu digo que sei bem o que é surtar por causa desse maravilhoso sistema avaliativo que destrói nossas vidas e nossa sophrosyne*. É difícil coordenar o tempo e cuidar da nossa saúde mental, enquanto estamos nos preparando para uma prova que muda as nossas vidas e é aí que entra uma técnica maravilhosa: A técnica Pomodoro.
 Ela foi desenvolvida em 1992 por Francisco Cirillo, um cara que, durante a faculdade, tinha dificuldade em se concentrar nos estudos e resolveu criar um método para aumentar a sua produtividade. E o melhor de tudo é que funciona com qualquer tarefa que você se proponha a fazer.

 A ideia é realizar ciclos de 25 minutos, chamados de Pomodoros, e, entre cada um deles, descansar por 4 ou 5 minutos. Depois de quatro ciclos desse, você tem direito a um intervalo maior, de 20 minutos, pra descansar a mente e permitir se manter produtivo.
 O primeiro passo é anotar tudo que você precisa fazer. Se a ideia é estudar alguma coisa, anote o que você precisa ler/escrever em uma listinha para que possa visualizar e ter uma noção de quantos ciclos vão ser necessários. Se você está trabalhando ou realizando atividades domésticas, é só anotar as funções que você precisa exercer.
 Para monitorar o tempo, você pode usar um timer de cozinha - que foi o que deu a ideia a Cirillo, mas que talvez seja muito barulhento para quem trabalha/estuda em grupo -, um cronômetro ou aplicativos específicos para isso.
 O meu favorito é o ClearFocus, mas como ele só está disponível para Android, você pode usar as alternativas para iOS: o Todoist e o Simple Pomodoro Timer são super elogiados, mas só de colocar Pomodoro para buscar na App Store dá pra achar várias opções.
 O ClearFocus é ótimo porque ele vem com a opção de desativar a internet do celular durante os Pomodoros, o que ajuda muito na concentração porque você sabe que, se cancelar o ciclo pra checar uma rede social ou mandar uma mensagem, vai ficar cada vez mais longe do intervalo maior. Fora isso, ele cria um gráfico que é ótimo para estudantes porque dá pra saber para quais matérias você está estudando mais e ajuda dividir o seu tempo direitinho de acordo com as prioridades.
 Dá para mudar o tempo de acordo com o que funciona melhor para você. Sejam ciclos maiores ou menores, é válido ir testando para ver com que se adapta melhor.
 De toda forma, muita sorte para todos os vestibulandos e mais produtividade para todos nós.
*Grego pra a combinação entre o nosso auto controle, a nossa prudência e o nosso temperamento. Um beijo para os leitores de Wonderfall
P.S.: Pra quem ainda quer revisar essa semana, o blog do Descomplica é sempre uma boa opção porque trás um monte de assuntos importantes de forma leve. No mais, só respire e confie que vai dar tudo certo. Sua saúde mental é mais importante que qualquer resultado.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Arquivo S: Que horas ela volta?

Desde que eu soube da indicação do filme Que horas ela volta? para representar o Brasil na categoria de filme estrangeiro do Oscar, fiquei morrendo de curiosidade de assistir. E aí que, depois de ler um monte de textos elogiando a obra, finalmente matei essa vontade e pude me juntar à legião de pessoas apaixonadas por essa produção maravilhosa.
 Apesar de gostar muito do título brasileiro, acho que o em inglês também representa muito a trama: Segunda mãe. Porque além de criticar toda a estrutura de trabalho doméstico no Brasil, a obra faz alusão ao fato da posição materna que as empregadas assumem diante dos filhos das famílias pras quais trabalham. Essa mulheres são, muitas vezes, responsáveis por grande parte da formação das crianças das quais cuidam.
ENREDO
 O filme, escrito e dirigido por Anna Muylaert, é protagonizado por Val (Regina Casé), uma pernambucana que se muda para São Paulo para trabalhar como empregada doméstica, onde se firma com uma família de classe média, em cuja casa mora e trabalha integralmente.
 Treze anos depois de decidir sair do estado de onde veio, Val recebe uma ligação da filha que pretende se mudar para a capital paulista, afim de prestar vestibular.
 A família para qual ela trabalha aceita prontamente receber Jéssica (Camila Márdila), afirmando que ela pode ficar "por tanto tempo quanto desejar", mas isso muda quando a garota se recusa a obedecer a determinações que a inferiorizam.

AVALIAÇÃO GERAL
 A obra é uma representação perfeita e delicada do relacionamento estabelecido entre empregas domésticas e patrões de classe média, que é baseado numa hierarquia disfarçada de empatia. Apesar de ouvir que é "praticamente da família", Val - a exemplo de várias outras mulheres brasileiras - tem que se contentar com um quartinho minúsculo e muito inferior ao dedicado aos hóspedes, se privar de comer certas coisas que são preferidas pelos patrões e atender a pedidos exagerados.
 É fácil se perder com o objetivo de retratar essa situação e acabar exagerando na medida, tornando a situação caricaturesca, mas Anna Muylaert passa longe disso. Dosando bem as cenas carinhosas entre a empregada e o filho da família com o tratamento que ela recebe do casal.
 Isso fica ainda mais evidente com a presença da filha dela, que se recusa a aceitar limites extremos que não apresentam explicações lógicas. Por que ela não pode se sentar à mesa? Por que tem que tomar aquele sorvete e não esse? Por que tem que se contentar com o quarto pequeno e abafado quando existe um bem mais espaçoso que está desocupado?

ELENCO
 Tive uma resistência inicial com aquela repetição de sempre da atriz do sudeste que faz um sotaque forçado pra representar um personagem nordestino. O que custa contratar uma atriz que seja realmente do lugar? Entendo que, só de ser associado ao nome da Regina Casé, o filme já receba um novo olhar, mas as nossas atrizes são tão boas quanto ela e só não têm reconhecimento porque a indústria não permite.
 Mesmo assim, gostei muito da atuação e achei que o papel combinou com o que ela tinha a oferecer. O sotaque não é lá muito convincente e o mainha sempre parece exagerado ao sair da boca dela, mas fora isso achei que ela teve uma sensibilidade maravilhosa que combinou com a sutileza da obra.
 Camila Márdila também teve uma atuação incrível. A ideia inicial da diretora era de ter uma atriz pernambucana pra interpretar a personagem, mas acabou mudando de ideia (por quêeee?) e escolhendo a brasiliense. O probleminha do sotaque também acontece, mas, como a própria Anna disse, ela conseguiu transmitir a secura que a Jéssica tem de uma forma brilhante.
 Outra que eu gostei muito foi a Karine Teles. Pra mim, a melhor forma de avaliar uma antagonista é prestar atenção em quantas vezes tenho vontade de entrar no filme e implorar pra que ela deixe de ser tão petulante/irritante/qualquer outro adjetivo que a descreva e isso aconteceu milhares de vezes com a Bárbara, personagem interpretada por ela.

OPINIÃO FINAL
 Apesar de ter um tema tenso e dramático, a obra é extremamente sutil, além de ser detentora de um ritmo muito agradável que permite que a dinâmica nunca morra. O ar de humor permanece no ar e em momento algum diminui o impacto da crítica feita.
 Esse filme é extraordinário e dá no público o tapa na cara de que tanto precisávamos. Dá vergonha de saber que não é nada ilusório, de que é exatamente desse jeitinho. Vivi a vida inteira com uma empregada em casa e pude me identificar com mais cenas do que gostaria. Do que deveria.
 É o tipo de obra que eu gostaria que passasse em todas as casas porque nós precisamos refletir sobre esse tema. E a Anna Muylart fez isso com uma maestria indiscutível. Cinco estrelas não são suficientes, esse filme merece cinco mil.